09 junho 2013

Mente confusa - No trem

       

          - Com licença.

Ele se sentou na poltrona 33. Em frente à 35.
Sim, 35 é a poltrona que estou sentada... Neste exato momento. Ele é bonito, confesso. Mas parece que não penteia o cabelo. Ou estava apressado demais. Sim, provavelmente estava com pressa. Isso deve justificar o fato dele estar agora mesmo olhando para o reflexo na janela tentando arrumar esse cabelo tão... Bagunçado!
Poxa vida! O que estou fazendo? Melhor eu olhar para a janela antes que ele note que estou reparando nele! Este trem está atrasado... Já deveria estar partindo...

         - Será que vendem comida aqui?
         - Não sei...

Como assim vendem comida? O que ele acha? Isto é um trem, não uma lanchonete! A menos que ele vá até a última estação. Mas seriam apenas 3 horas de viagem.  Acho que ele não almoçou e deve estar com fome.

        - Quer uma?

Bolacha de sal? Ele está louco? Passarei a viagem toda com sede!

       -Não, obrigada.

Será que ele está querendo puxar assunto comigo? Ou só está sendo educado? Por Deus! Já pensou se ele é casado ou comprometido, sei lá... E eu imaginando que ele pode estar dando em cima de mim! Tenho que me controlar. Mas parece que ele não tem nenhuma aliança. Droga! Estou reparando nele de novo! Acho que ele deve ter notado! Tomara que não tenha percebido. Ele está sujando todo o chão com essas bolachas de sal!

       - Vai até a última estação?

Por que ele quer saber? Meu Deus! A boca dele está toda suja de bolacha!

      - Sim.  Vou visitar minha mãe.

Pronto! Daqui a pouco começo a contar da minha vida toda para ele! E eu não deveria ter dado esse sorriso! Vou parecer uma oferecida, desesperada...

      - Eu também vou até a última.  Para visitar também. Não minha mãe, outra pessoa...

Ele desviou o olhar para a janela. Deve estar indo visitar a namorada. Aposto! Mas é claro! Ele percebeu que estou sendo muito oferecida e está fazendo questão que eu perceba que ele já é comprometido. Preciso arrumar isto. Melhor não. Se eu falar estará perfeitamente claro que estou me oferecendo. Vou colocar os fones de ouvido. Ele vai notar que não estou interessada. Que música é essa?

       - Gosta de música?

Que raio de pergunta foi essa? Como ele é estúpido!

        - Ah sim... Gosto.
        - Está ouvindo o que?

Eu não sei o que estou ouvindo!

         - Ouça.

Não acredito que ofereci um dos fones de ouvido para ele! Estou ficando maluca, só pode! Vou desligar...

       - Não estou ouvindo.

       - Ah, acabou a bateria!

Sou muito ridícula!

      - Sem problemas!

Que sorriso lindo! Tenho que olhar pro lado. Estou olhando demais pra ele!

      - A propósito, me chamo Bernardo, prazer em conhecê-la.
      - O prazer é meu.

Prazer? Quê? 
- Não tem nome?

Tenho sim. Sou sua futura esposa.
- Ah sim, meu nome é Midori.

Será que estou sendo muito chata? Ele está olhando para a janela de novo. Deve estar pensando que poderia ter uma pessoa melhor para viajar ao lado dele neste trem. Mas o que eu poderia falar com ele? Economia, política? Ele não tem cara de quem gosta dessas coisas.

       - O céu está bonito hoje.

Alguém me mata, por favor! Estou falando do tempo! Socorro!

        - Verdade. Isso é difícil de acontecer. Oportunidades raras devem ser aproveitadas, não acha?
        -Sim, claro.


Claro? O que estou dizendo? Ele dá uma das cantadas mais ridículas e eu ainda concordo, é isso mesmo? Faltam 2 horas e meia de viagem! Quanto tempo ainda vou aguentar?

 

Carta aberta ao F.

 Assim como você, eu também não sou a pessoa mais perfeita do mundo. Eu sei que às vezes (ou quase sempre), tenho agido como a pior pessoa.....